Impossibilidade jurídica de antecipar a aprovação de dividendos

29 de dezembro de 2025
Conjur

A reforma da tributação dos dividendos promovida pela Lei nº 15.270/2025 inaugurou uma controvérsia jurídica relevante ao condicionar a manutenção da isenção do Imposto de Renda sobre lucros apurados até o ano-calendário de 2025 à aprovação da respectiva distribuição até 31 de dezembro do mesmo ano. A exigência, à primeira vista operacional, revela-se, na prática, incompatível com a estrutura obrigatória do direito societário brasileiro.

O ordenamento jurídico estabelece uma cronologia rígida e inderrogável para a apuração e destinação dos lucros. Nos termos dos artigos 132 e 133 da Lei nº 6.404/1976, a deliberação sobre a destinação do lucro líquido e a distribuição de dividendos é matéria de competência privativa da assembleia geral ordinária, a ser realizada nos quatro primeiros meses subsequentes ao encerramento do exercício social. Tal procedimento pressupõe o encerramento do exercício, a elaboração das demonstrações financeiras, sua disponibilização prévia aos sócios ou acionistas e, quando aplicável, auditoria independente.

Nesse contexto, exigir que a aprovação da distribuição ocorra até 31 de dezembro de 2025 significa impor ao contribuinte uma condição que não pode ser juridicamente satisfeita. Em 31 de dezembro, o exercício social ainda está em curso; não há lucro líquido definitivamente apurado, balanço fechado ou demonstrações consolidadas. A antecipação da deliberação, além de tecnicamente inviável, viola normas societárias de ordem pública, expõe administradores a responsabilidade pessoal e pode conduzir à nulidade do ato deliberativo.

O problema não se limita à esfera societária. Ao condicionar um benefício fiscal ao descumprimento de regras cogentes do direito empresarial, a Lei nº 15.270/2025 cria uma antinomia normativa insuperável e compromete a segurança jurídica.

 

Escolha impossível

A legislação tributária não pode alterar o conteúdo, o alcance ou o regime jurídico de institutos de direito privado, conforme expressamente veda o artigo 110 do Código Tributário Nacional. Assembleias, prazos e competências societárias não são elementos disponíveis à livre conformação do legislador tributário.

 

O efeito prático da exigência é submeter as empresas a uma escolha impossível: cumprir a legislação societária e sofrer tributação sobre lucros gerados sob regime de isenção, ou violar regras societárias para preservar o tratamento fiscal anterior. Em ambos os casos, há prejuízo relevante — seja financeiro, seja jurídico — com potencial impacto sobre governança corporativa, responsabilidade de administradores e planejamento empresarial.

Diante desse cenário, começa a ganhar força a interpretação segundo a qual a exigência de aprovação até 31 de dezembro deve ser lida de forma sistemática e conforme o ordenamento jurídico, de modo a preservar a regra de transição pretendida pelo legislador — a não tributação de lucros já apurados — sem impor o descumprimento de normas societárias obrigatórias.

Sob essa ótica, a aprovação válida da distribuição ocorreria nos prazos legalmente previstos para a assembleia geral ordinária, ainda que realizada no exercício seguinte.

Essa leitura já vem sendo acolhida pelo Judiciário em decisões recentes, inclusive com deferimento de medidas de urgência para afastar a exigência literal da lei, reconhecendo que o direito não pode exigir o juridicamente impossível.

O tema tende a se consolidar como uma das principais discussões do período de transição da nova tributação dos dividendos, com reflexos diretos para sociedades empresárias, associações, administradores e investidores.

Compartilhe nas redes sociais
Facebook Twitter Linkedin
Voltar para a listagem de notícias

Vamos Conversar? Caso tenha alguma dúvida, crítica ou sugestão, entre em contato!

Entre em contato conosco para esclarecer suas dúvidas, solicitar suporte, resolver problemas ou dar sugestões. Veja todas as opções de contato disponíveis.

Preencha corretamente o nosso formulário de contato.

Rua João Gurgel - 2247 - Centro

Araraquara / SP - CEP: 12345-000

Contato

(16)3332-6280

E-mail

contato@escritoriopadrao.cnt.br

Sitecontabil © 2020 - 2025 | Todos os direitos reservados